O investimento de R$ 40 bilhões na indústria automobilística até 2015, com o desenvolvimento de novos veículos e ampliação de fábricas, deve ser acompanhado de um choque de competitividade, capaz de solucionar os problemas de infraestrutura para tornar efetivas as iniciativas na área de produção. O alerta veio dos palestrantes do Simpósio SAE BRASIL de Manufatura Automotiva, promovido no dia 21 de junho em São Paulo.
Os efeitos da crise econômica internacional persistem, com o excesso de capacidade de produção global provocando mudanças no mapa da manufatura automotiva, deslocada para países emergentes como China, Índia e Brasil. Pressões dos players externos, deficiências logísticas e dificuldade em promover as exportações envolvem as operações brasileiras em uma verdadeira guerra para reduzir custos, tornar as linhas de montagens flexíveis e racionalizar as cadeias de suprimento.
José Eugênio Pinheiro, vice-presidente de Manufatura da General Motors, admitiu que o expressivo crescimento do mercado interno e os investimentos confirmados pela companhia na região exigiram a revisão das estratégias de produção no País. Uma das principais preocupações é elevar a capacidade de produção e tornar as linhas de montagem mais flexíveis para atender a fabricação de diferentes veículos nas mesmas instalações. “A tendência é maximizar o volume de produção, com linhas de montagens mais curtas, processos enxutos e com menor custo”, disse.
Na busca da redução de custos a Renault investiu no conceito Monozukuri, que promove as melhores práticas em todas as áreas da empresa, desde a cadeia de suprimentos até a distribuição dos produtos finais. O objetivo é gerar resultados financeiros expressivos, através da inovação, benchmarking e ferramentas Kaizen. Com o programa, a Renault otimizou o sistema de embalagens de peças na planta brasileira, antes copiado da matriz. “Ampliamos o número de peças embaladas, em alguns casos, com redução significativa de custos”, explica Marcelo Mello, gerente geral para Monozukuri da Renault.
A Volkswagen do Brasil investirá R$ 6,2 bilhões no País até 2014 para desenvolver novos produtos e elevar a capacidade de suas fábricas de São Bernardo e Taubaté, em São Paulo. A montadora passa por mudanças para implementação da manufatura digital em São Bernardo, com softwares de simulação e tecnologias 3D para otimizar processos e enxugar custos antes de o produto entrar na linha de produção.
“A aplicação da realidade virtual em processos como montagem e desmontagem de portas, estamparia, pintura, ergonomia e simulação de fluxos de produção trouxe redução de investimento, diminuição de estoque em processo, melhoria de produtividade e identificação de gargalos”, contou Marco Antonio Teixeira, diretor da fábrica Anchieta da Volkswagen. O executivo disse que a simulação da montagem final ainda proporcionou ganho de quase 20% em produtividade.
Pesados - A Mercedes-Benz do Brasil já projeta a produção de 75 mil caminhões, superando a matriz alemã, que deve montar 60 mil unidades. A montadora produz a maior parte dos sistemas que utiliza para a montagem dos caminhões e vive um de seus bons momentos no mercado. “Com a fábrica de São Bernardo no limite da capacidade, a empresa projeta a adequação da unidade de Juiz de Fora, MG, para produzir caminhões leves e o pesado Actros”, disse Roberto Bastian, diretor de Logística e Infraestrutura da Mercedes-Benz, que deverá alcançar em 2020 a produção de 200 mil unidades por ano.
Na visão de Paulo de Tarso Petroni, sócio-diretor da PricewaterhouseCoopers, a ocupação acima de 90% da capacidade produtiva prejudica as operações e leva à inserção de erros e ao aumento de custos. “O ideal é que as fábricas trabalhem com 70% da capacidade instalada, para não gerar estresse e falhas“, aconselhou. Petroni analisou o cenário econômico no Brasil e disse que o aumento do poder aquisitivo da populacão e os investimentos até 2020, junto com eventos como as Olimpíadas e a Copa do Mundo, trarão grandes oportunidades para o setor da mobilidade nos próximos anos.
“O desafio é ser competitivo. Com a agressividade das mudanças, é preciso agir rápido, reduzir custos e valorizar a inovação. O ciclo de vida dos produtos fica cada vez menor e temos de fazer modelos e versões de baixo custo e com diferenciais", disse. Petroni destacou ainda que a produção anunciada de veículos não será capaz de atender a demanda, exigindo novas estratégias.
Os gargalos em suprimentos foram avaliados por Mauricélio Faria, gerente de Logística da Fiat Automóveis. Para ele, o Brasil poderá sofrer um ‘apagão logístico’ nos próximos anos. “Investimos muito em produção, mas temos aeroportos que demoram para liberar mercadorias, portos com custos elevados, cabotagem subutilizada e estradas em estado precário”, alertou, enfatizando que o custo da logística no Brasil é alto e prejudica a competitividade da indústria brasileira.
Mauricélio Faria afirmou que enquanto o custo logístico local representa 11,6% do PIB, nos Estados Unidos não chega a 8%. “Os investimentos em fábricas, projetos e inovação perderão a eficiência se os gargalos continuarem no nível atual”, disse.
Aeroespacial - A Embraer passou por uma revolução na manufatura para ganhar competitividade, como transformar a produção artesanal em processos “lean” para montar 240 aviões por ano. Desde 2007, a empresa utiliza manufatura digital e automação, além do programa Kaizen de melhoria contínua.
"Conseguimos reduzir em 50% a movimentação dos aviões dentro do parque fabril e otimizar o tempo de produção de 22 para 12 dias. Já as não-conformidades foram reduzidas em 89% de 2007 para cá", relatou Francisco Luciano Soares Neto, diretor de Estratégia Industrial na Embraer, que estrutura novas plantas em Portugal e nos Estados Unidos. "O objetivo é proteger os negócios nos nossos maiores mercados", explicou.
A Dana também promoveu grande reestruturação no período de crise econômica mundial e passou a focar em produtos e processos globais. Em 2008, consolidou a implantação da cultura “lean”, reduziu a gama de produtos oferecidos e reestruturou o comando da empresa, presente em 26 países. "Em um ano tivemos um ganho de performance de mais de 1.000%", relatou Harro Burmann, presidente da Dana para a América do Sul.
Workshop na VW – No dia 22 de junho, a Volkswagen recebeu participantes do simpósio de manufatura para um workshop e visita às linhas de produção na fábrica Anchieta. O diretor da unidade, Marco Antonio Teixeira, destacou os esforços da empresa no desenvolvimento de pessoal, em colaboração com o Senai, e o foco em inovação e tecnologia.
Vagner Galeote, vice-presidente da SAE BRASIL, afirmou que é importante aproveitar os investimentos expressivos atuais na indústria automobilística para incentivar um aumento de competitividade. "Precisamos investir em inovação e na criação de produtos globais com maior qualidade e durabilidade. O momento é agora", garante. |